quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

POBRES FANÁTICOS, LOUCOS ASSASSINOS

- Então D. Rosalinda, ouvi dizer que adorou a Missa do Galo?
- É verdade Mário, nunca tinha visto coisa igual!!! Imagina que até houve um momento de teatro.
- Mas isso é coisa nunca vista realmente, não estará a senhora a confundir as coisas?
- Não estão não Mário, eu própria nem queria acreditar quando o Sr. padre anunciou aquela novidade.
- Mas Luísa, isso é passar do 8 para o 80, numa paróquia em que as coisas se mantinham demasiado austeras muito distantes dos menos beatos .
- Tens razão Mário, talvez com esta mudança de atitude o novo pároco queira cativar os irmãos desavindos.
- Talvez tenhas razão Luísa mas, mesmo assim, não me sinto muito cativado a ser um católico praticante. Então e conte-me lá, tiveram muitas prendas no sapatinho?
- Nem por isso Mário. Na minha idade já não são de esperar muitas prendas. Para mim bastou-me a presença do meu filho e da minha nora e a felicidade da minha neta.
- E tu Luísa, também és da opinião da D. Rosalinda ou, pelo contrário, aprecias umas coisas mais...como direi, valiosas?
- Olha meu querido, recebi do meu António um anel de noivado extraordinariamente belo.
- Então estás de parabéns!!!! Espero que seja aquilo que mais queiras.
- Obrigado pela tua simpatia. Já agora, desculpa lá se pergunto, também tu recebeste a prenda que desejaste?
- Bom, mais uma vez o euro milhões me falhou mas, em contrapartida, recebi um agradável perfume oferecido por alguém muito especial.
- Não me digas que....
- Não comeces a inventar Luísa.
- Vamos para baixo Luísa, que já chega de conversa.
- Sim D. Rosalinda, é para já.
Entretanto, a Cristina pede-me para preparar uma aguardente velha em copo aquecido para o cavalheiro que está sentado na mesa 10.
- Olha Cristina, adorei o teu presente!!! Foi a primeira coisa que coloquei no meu corpo assim que tomei banho.
- Gostaste? Eu também achei que cheirava muito bem e que, acima de tudo, tinha tudo a ver contigo.
- Também adorei conhecer a tua filha. Acho que para uma menina de 4 anos está muito crescida e muito desenvolvida, além disso é muito bonita.
- Sai à mãe!!!!
- E ao pai, claro.
- Claro que sim, mas não quero falar nisso porque esse indivíduo já me causou problemas de sobra.
- Pronto então, não falemos nisso. Olha, toma a aguardente, tal como pediste.
- Obrigado Mário, és muito eficiente.
Quando me voltei, já o Luís estava ao balcão do bar da pensão. Não sei se terá reparado no momento de carinho mas também já é novidade para ele o meu relacionamento com a Cristina.
- Então amigo, tiveste um bom Natal?
- Muito bom amigo Luís espero que o teu também tenha sido.
- Olha meu caro, que seja sempre assim, com saúde e junto da família.
- E novidades?
- Olha, tirando o trágico assassinato de Benazir Bhutto, só mesmo a luta pelo domínio do maior banco privado português.
- Pobres fanáticos, loucos assassinos aqueles que conseguem perpetrar tão repudiante acto.
- É o preço que se paga por ter coragem meu caro Mário.
- É bem verdade Luís e que vais beber?
- Pode ser um whisky velho, com uma pedra de gelo.
- Também te acompanho Luís, apetece-me um bom e macio whisky. Voltando à conversa, falaste do B.C.P. e da luta quase fratricida pela liderança desse gigante português.
- É verdade Mário, quando cheira a dinheiro montam logo o circo para ver quem há-de ser eleito o melhor palhaço.
- A propósito, também li hoje, num espaço que habitualmente frequento, uma opinião muito realista e directa acerca desse assunto. Raramente se engana aquele amigo e, além disso toca na ferida sem constrangimentos.
- Também por lá passei e, confesso que concordo com ele sobretudo quando diz que "é tudo a mesma merda".
- Tens razão Luís, só as moscas é que mudam.
I

domingo, 23 de dezembro de 2007

DOCES DE NATAL

Na pensão vive-se um ambiente muito especial. Imbuídos do espírito natalício, todos fazem questão de transmitir aquela paz que só nestas alturas (infelizmente) parece tomar conta de todos, deixando toda a gente feliz, mais condescendente para com o próximo e mais receptiva à resolução dos problemas dos mais carenciados. Não é incomum irromperem pela pensão adentro algumas pessoas à procura de algo para melhor passarem estes dias festivos. A D. Rosalinda faz sempre questão de ter à disposição de quem nos visita, um sem número de doces tradicionais desta quadra. Curiosamente, este ano, não se ficou pelas tradicionais broinhas de natal ou pelas deliciosas filhoses ou até mesmo pelo indispensável Bolo Rei. Desta vez foi mais além, aproveitando a chegada do filho e da nora, optou por colocar na mesa, onde habitualmente se encontram todos esses doces, um delicioso Panettone, que a Susana tão bem soube fazer e, imagine-se, "raclete", uma espécie de tosta de queijo, com uma elaboração especial e com um queijo, tradicionalmente suiça.
Lá fora a iluminação não abunda, diria mesmo que está sobriamente instalada, a contrastar com o exagero do passado ano. Talvez a contenção de despesas a isso tenha obrigado mas, um pouquinho mais não faria a diferença e aquecia alma.
Como era de esperar, não faltou a cabana onde nasceu Jesus que, pese embora a falta de espaço, foi originalmente construída junto à torre da igreja matriz pelo Agrupamento de Escuteiros de Penacova. O burro, esse não está presente, nem poderia pois, para além de não ter espaço, foi utilizado para transportar o Pai Natal. Quanto à vaca também nem sinal, por um lado, porque a dificuldade em colocar tal animal em tão exíguo local prejudicava a sua presença, por outro, não havendo "menino" para aquecer, deixa de ser fundamental a presença daqueles seus habituais companheiros de presépio.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

RESIGNADAMENTE DE ACORDO

- Então Mário, se bem percebi, a partir do próximo ano, vamos ter que aprender a escrever de novo?
- Mais ou menos Alice, apenas algumas palavras vão sofrer alterações.
- E sabes quais?
- Bem, segundo o acordado entre os Estados cuja língua oficial é o português, vão desaparecer da nossa escrita as letras mudas e algumas palavras com hífen, assim, se agora escreves "afectivo", com a entrada em vigor do novo acordo, passarás a escrever "afetivo".
- Ou "batismo" em vez de "baptismo".
- Exacto. Quanto àquelas que habitualmente escrevemos com hífen, como por exemplo "mini-saia"...
- Passaremos a escrever "minissaia".
- Nem mais Alice, apesar de ter consciência que vai ser um bocado complicado aplicar as novas regras, sobretudo para mim que sempre escrevi desta maneira, não creio que vá ser um bicho-de-sete-cabeças ou bichodessetecabeças. (riso)
- Para mim e para os meus colegas também vai ser um bocado difícil mas, aos poucos e com o hábito, vamo-nos habituando.
- Claro Alice, o "hábito faz o monge", já não me atrevendo a dizer o mesmo relativamente à tua avó, cuja aprendizagem e mecânica vai ser mais difícil.
- Mas Mário, eu também li que algumas palavras vão perder o acento circunflexo, estou a lembrar-me por exemplo, das palavras "vêem" ou "crêem" que com as novas regras vão deixar de ter aquele sinal diacrítico.
- São inúmeras as alterações de que vai ser alvo a nossa forma de escrever mas, convém dizer que este acordo foi assinado pela primeira vez em 1990 e que só agora, após sucessivos protocolos modificativos, vai finalmente entrar em vigor.
- E concordas com todas essas alterações?
- Bom, para ser franco gosto muito da nossa forma de escrever, além disso, convém não esquecer, que a língua portuguesa "nasceu" em Portugal e, como é lógico, quem devia ditar as regras acerca desse assunto seríamos nós, contudo somos apenas dez milhões de portugueses para um universo de cento e noventa milhões, como é o caso do Brasil, o que naturalmente nos coloca num situação desvantajosa.
- E...
- E..., como contra factos não há argumentos, quando não os podes vencer, junta-te a eles, tal como aconteceu com o Euro quando substituiu o Escudo.
- Posso então concluir que está de acordo com este “acordo”.
- Mais resignado do que de acordo, será essa a forma que caracterizará a minha posição acerca do assunto.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

O RISCO DE QUEM QUER CASA (R)

- Foi uma boa notícia para quem tem crédito à habitação, não achas Luísa?
- Se acho Susana. Eu estava a ver que esta fase da subida das taxas de juros nunca mais parava a ponto de eu e o meu António temermos pela nossa própria casa.
- Mas parece que não vai ser por muito tempo, porque a situação dos mercados internacionais não é nada favorável a que as taxas se mantenham assim por muito mais tempo.
- Quer dizer que estão previstas novas subidas?
- Claro Luísa, mas também, quando as novas regras entrarem em vigor, os empréstimos para a aquisição de habitação podem ser negociados com qualquer banco da União Europeia e, dessa forma, as prestações passarão a ser mais baixas o que, como bem deves saber, isso permite-nos respirar com um pouco mais de alívio sem temer o pior cenário.
- Tomara que sim Susana porque, da maneira que as coisas estão a ficar, qualquer dia vou ter que ir viver para casa da mãe do meu António, coisa que eu nunca desejaria.
- Porquê, também não gostas de sogras?
- Não é esse o caso Susana, a questão é que, quem casa quer casa e, como eu e o meu António estamos a pensar casar para o próximo Verão, não calhava muito bem que isso acontecesse.
- Então não te preocupes que tudo se irá resolver. Além disso, sempre podes falar com a D. Rosalinda e pedir-lhe um aumento.
- Achas? A D. Rosalinda nem sequer quer falar no assunto. Diz ela que o recente aumento do ordenado mínimo nacional já é mais do que suficiente e já se esteve a chorar a dizer que as coisas estão más, que o negócio não corre. Aquelas coisas de patrão, sabes?
- Claro que sei Luísa. Pensas que eu também já não passei por isso? A D. Rosalinda tem que gerir o negócio da melhor maneira para ver se a pensão se mantém a navegar em águas calmas como até aqui.
- Outra coisa Susana. Tu não achas que se passa alguma coisa com a Cristina?
- Como assim?
- Penso que ela está a esconder alguma coisa?
- Achas?
- Então tu não achas estranho que ela tenha recusado uma ida para o estrangeiro sem motivo aparente?
- Olha Luísa, a seu tempo saberás porque razão a Cristina não foi para a Inglaterra. Depois, compreenderás porque motivo ela optou por cá ficar.
- Então sempre há alguma coisa?
- Sim, de facto há uma coisa, que não é uma coisa propriamente dita, mas sim alguém muito próximo da Cristina e de quem ela gosta muito e de quem todos nós também iremos gostar concerteza.
- Quer dizer que a revelação está para breve.
- Sim, para muito breve.
I

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

DA PENSÃO PARA O HOTEL

Em mais uma passagem por Penacova, regresso ao meu quarto da Pensão que o Recepcionista sempre me acautela, mais os cuidados da D. Rosalinda. Tudo está posto no seu lugar e a temperatura dentro da Pensão faz esquecer a guieira que bate à porta da rua, pelo lado de fora.
Na recepção, os jornais e os panfletos do costume. Um, em particular chamou-me a atenção.
O Hotel Penacova, "concorrente" desta pensão, vai reabrir com festa de arromba e fogo de artifício e tudo...
O motivo é, de facto, para festa e o fogo de artifício na passagem de ano poderá ser uma novidade nesta tão pacata vila.
O que se espera é que a festa dure para lá do segundo da passagem de ano. É preciso dinamizar esta terra e o Hotel, sozinho, vai conseguir pouco se não existirem bares dignos desse nome, se não existir um fio condutor cultural que justifique a vinda a Penacova. Não basta ter um Hotel, por muito bem localizado que esteja na paisagem se não há nada do ponto de vista da ocupação do tempo e do lazer.
A menos que se queira que o Hotel sirva apenas para as pessoas virem para aqui dormir e descansar dormindo... Porque não há mais nada para ver ou fazer, sobretudo à noite.
Eu até nem me queixo. Passo cá em trânsito para outras paragens e basta-me o conforto do "meu" quarto de Pensão...

Foto

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

AS ESTRELAS DE BALI

- Parece que em Bali as coisas estão um bocado "quentes", não achas Mário?
- Quentes e de que maneira Luís, principalmente depois da tomada de posição do presidente Bush em tentar protelar ainda mais as limitações às emissões de gases que contribuem para o efeito de estufa.
- Sabes Mário, acho uma perfeita parvoíce estarem a contar com aquele paspalho para decidirem alguma coisa em benefício do planeta.
- Tens razão Luís, aquele indivíduo não tem um pingo de vergonha e muito menos respeito pelo nosso futuro. A economia norte-americana está basicamente dependente do petróleo, tudo nela gira à volta do ouro negro e para ele impor regras severas às suas empresas é o mesmo que estar a ditar-lhes a morte prematura e a hipotecar o seu futuro político.
- Tudo bem, até pode ser assim Mário, mas não vamos sacrificar o equilíbrio ecológico do nosso planeta por existirem meia dúzia de energúmenos que temem pelas suas fortunas ironicamente construídas à custa dos constantes atentados contra o planeta.
- E se o presidente Bush não mudar de posição, a E.U. ameaça não comparecer na reunião agendada para o final de Janeiro no Havai.
- Alguém tem que tomar uma posição de força para ver se todos invertem a tendência poluidora a que todos estávamos habituados. Até mesmo Portugal ultrapassou em 15,8 por cento o limite de emissões estabelecidas pelo Protocolo de Quioto.
- Quando o exemplo vem de cima todos se sentem no direito de prevaricar, pena é que, para muitos e sobretudo para os mais pobres, o desenvolvimento, ainda depende das energias poluidoras e, no nosso caso, com estamos praticamente dependentes do exterior, estamos reféns dessas tecnologias que, apesar de baratas e poluidoras, contribuem para o nosso desenvolvimento.
- Olha amigo, enquanto eles não chegam a consenso, vamo-nos preparar para saborear o polvo no forno com batatas que a Susana confeccionou para o jantar e beber um espumante da "Quinta da Calçada Bruto" que a Cristina fez questão de aconselhar para acompanhar aquele magnífico manjar.
- Depois Mário, vamos esperar ter sorte com o céu para ver se conseguimos observar a chuva de estrelas que está prevista para esta noite.

foto: Yusuf Ahmed Tawil/Reuters

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

(T)RATADO DE LISBOA

- Finalmente a Europa viu-se livre da presidência portuguesa.
- Não sejas assim Paulo, não me digas que não gostaste da prestação dos nossos governantes durante os seis meses em que estiveram à frente dos destinos da União?
- Bom, para falar a sério, acho que nem nos portamos muito mal. Resolvemos o imbróglio do Tratado de Lisboa e conseguimos reforçar as relações com África.
- Estás a ver que afinal não foi assim tão negativa a presidência portuguesa da União Europeia.
- Só acho que escusávamos de ter sido o país que mais ditadores e facínoras conseguiu reunir de uma só vez e em tão pouco tempo, no mesmo espaço.
- Mas agora vem a melhor parte Paulo, os nossos partidos da oposição já lançaram o desafio ao governo para referendar a ratificação do novo tratado.
- Eu acho muito bem que ele seja referendado.
- Ai sim, e porquê?
- Porque se o novo tratado vem substituir a constituição da europeia, então deve ser analisado antes de ser ratificado, para assim ver se serve ou não aos cidadãos.
- Mas isso é perder tempo e dinheiro. Nós temos, de uma maneira ou de outra, que ter regras que nos unam nas nossas diferenças e que estabeleçam as metas de actuação para a sustentabilidade da união.
- Mesmo assim Mário. Mesmo sabendo que isso é necessário não podemos acreditar nos políticos porque só se protegem uns aos outros sem olharem para a verdadeira resolução dos problemas que nos afectam todos os dias.
- O problema Paulo, não está no facto de eles não olharem mas sim no facto de eles não fazerem, porque fartos de saber o que se passa estão eles.
I

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

PROIBIR SEM FANATISMOS

Iii
- Parece que a partir do próximo dia 1 de Janeiro vai ser mais difícil fumar nos locais abertos ao público.
- Tudo indica que sim D. Rosalinda, vamos lá a ver é se os fumadores vão respeitar as limitações que a Lei vai impor.
- Olha Mário, pelo menos aqui na pensão não vão ter esse problema, uma vez que existem espaços para todos se sentirem bem. Quem quiser fumar pode fazê-lo na sala onde é permitido, sem se sentir minimamente deslocado ou rejeitado por, ainda, ser um fumador. Quem, por sua vez, não quiser fumar, ou por não ter esse vício, ou por achar que não o deve fazer e assim preferir a sala onde é proibido fumar, também tem todas as condições para se sentir em casa.
- Sem fanatismos não é D. Rosalinda?
- Claro que sim Mário, aliás até condeno bastante esse olhar de soslaio vindo daqueles que não fumam para aqueles que, ainda, fumam.
- Em alguns casos até pode causar mau estar entre uns e outros.
- Exactamente Mário e, no nosso caso, não pretendemos que os nossos hóspedes se sintam incomodados por tal motivo, se bem que, depois de analisadas as coisas, todos temos o direito de zelar pela nossa saúde e não aceitar de bom grado que nos estejam a mandar baforadas de fumo para cima.
- Sabe uma coisa D. Rosalinda? Eu acho que o Estado é o grande culpado desta situação toda.
- Ah sim Mário, e porquê?
- Então D. Rosalinda, está bom de ver, se o Estado é quem tem o monopólio da venda do tabaco, se é ele que arrecada a maior parte dos lucros, então devia por e simplesmente acabar com a venda de algo que prejudica gravemente a saúde, não acha?
- Não totalmente Mário. Em certo aspecto és capaz de ter razão, pois o Estado que agora condena, severamente diga-se, o consumo do tabaco, foi aquele que durante décadas o promoveu mas, por outro lado, é ao Estado que cabe salvaguardar a saúde dos seus cidadãos e zelar para que as regras para a proteger sejam efectivamente cumpridas, portanto, temos um Estado que, por um lado está a pagar as consequências de anos de incentivo ao consumo e, por outro, um Estado que procura evitar a todo o custo a tentação de consumir através de campanhas antitabágicas bastante severas e extremamente dispendiosas.
- Posso assim concluir que o Estado age sempre em função dos seus interesses, dependendo das tendências e das conclusões a que se vai chegando com a constatação dos erros que resultaram de políticas que, na sua maior parte, só são tomadas para favorecer grandes grupos económicos com a promessa de postos de trabalho e de outras contrapartidas que, grande parte das vezes, não dão em nada.
- Infelizmente é aquilo que se passa Mário, somos todos cobaias das "experiências" que aqueles que nos deviam defender levam a cabo para agradar não se sabe muito bem a quem, mas de certeza a alguém que, em algum momento, os beneficiou.
I

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

OS BURROS DO PAI NATAL

- Alice, parece que afinal também vamos ter a visita do Pai Natal.
- A sério Cristina, em que dia?
- Pelo prospecto que entregaram ao Mário, será no dia 22.
- Que beleza, pelo menos este ano vamos ter algo de diferente em Penacova.
- Diferente e de que maneira, vê lá tu que além do Pai Natal, também vai haver um espectáculo ao ar livre com vários personagens que vão percorrer as ruas da vila durante toda a manhã.
- Estou ansiosa para que chegue o dia 22.
- Mas há mais!!! O Pai Natal chegará de burro, acompanhado pelos seus ajudantes, e as crianças poderão dar umas voltinhas pelo Terreiro.
- Será um daqueles burros que normalmente são utilizados para fazer os passeios?
- Provavelmente será?
- Mas Cristina, há uma coisa que eu não compreendo, o Pai Natal não se faz transportar de trenó puxado por renas?
- Sim normalmente é o que acontece, mas numa terra em que abundam esses animais, é natural que os utilizem quando é necessário transportar alguém.
- E os ajudantes do Pai Natal, serão duendes?
- Talvez não, tudo depende do Pai Natal.
- Como assim Cristina?
- Se por exemplo o Pai Natal for o Presidente da Câmara, então os seus ajudantes serão, como é natural, os vereadores.
- E o burro?
- Bom, o burro....fica ao critério de cada um mas, a julgar pela abundância com que os vemos por aí, não será necessário puxar muito pela cabeça para imaginar quem seja.
I

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

ESTRELAS DE NATAL

- O Espírito do Natal começa a tomar conta de nós, não achas Alice?
- Acho sim Cristina. As pessoas começam a ficar mais simpáticas, mais compreensivas e mais tolerantes.
- Eu adoro quando vamos buscar os enfeites e começamos a pendurar as gambiarras e a preparar a Árvore de Natal. Todo este ambiente me faz lembrar os momentos que passava com a minha família e sobretudo com os meus irmãos, sempre ansiosos que estávamos por chegar a hora de abrir as prendas.
- Este ano a minha avó comprou uma enorme Árvore de Natal branca para colocar no centro da sala de estar, decorada com bolas vermelhas e com uma estrela igualmente grande e dourada.
- E onde vai ser construído o presépio?
- Normalmente é construído junto à recepção para que seja a primeira coisa que os hóspedes encontram quando entram na pensão. Além disso, o Mário gosta muito de ver todas aquelas miniaturas a movimentarem-se como se de uma comunidade ao vivo se tratasse e também por ali está, sempre que for necessário dar um jeito.
- Mas olha que este vai ser o fim-de-semana em que muitas localidades vão dar início aos festejos do Natal.
- Ai sim Cristina, então quais?
- Olha, por exemplo, estou a lembrar-me da Vila Natal em Óbidos da Feira de Natal na Lousã ou até mesmo do maior presépio animado do país em Penela.
- Que giro como alguns municípios se empenham em celebrar de forma diferente o Natal, aproveitando as características da sua paisagem e até mesmo a singularidade dos seus edifícios para os adaptarem à quadra festiva que se aproxima.
- E por cá Alice, como costuma ser o Natal?
- Olha Cristina, por cá as ruas são iluminadas, as crianças nas escolas têm as suas próprias festas e, além disso, pouco mais acontece. Aqui na pensão, decoramos tudo a preceito, saboreamos as rabanadas, as filhoses e as broinhas feitas pela Susana e vestimo-nos com aqueles pequenos gorros vermelhos que têm um pompom branco na ponta, sabes?
- Claro que sei e, confesso que me sinto muito bem assim. Gosto de transmitir a paz natalícia aos outros e, principalmente, aos nossos hóspedes.
- Olha, estás a ver esta Estrela de Natal?
- Sim estou, é grande e brilhante, faz lembrar a Estrela Polar.
- Foram os meus pais que ma deram para que todos os natais me lembre deles.
- E eles, onde estão?
- Estão na Suiça, país dos Alpes e da neve.
- Há muitos anos?
- Sim, há cerca de 12.
- Eras pequena então, quando eles foram.
- Sim, tinha apenas 4 anos, mas este ano vêm cá passar o Natal.
- Então, este Natal vai ser magnífico para ti.
- Assim espero Cristina.
I

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

CONTADORES DE PLÁSTICO

-Então, se bem percebi, vamos ter que pagar 5 cêntimos por cada saco de plástico que trouxermos com as compras do supermercado.
- Claro Susana, agora de cada vez que quiseres ir comprar a mercearia ou outra coisa qualquer, tens que levar uma cesta para trazer as coisas que comprares.
- Sabes uma coisa Luísa, também vou ser sincera contigo, a mim incomodava-me imenso que os sacos fossem dados sem qualquer tipo de controlo e tu bem sabes que a D. Rosalinda era a que mais trazia. Ou porque precisava deles para a lã dos arraiolos, ou para pôr as folhas caídas do jardim, enfim, por qualquer coisa lá trazia um saco e isso, a multiplicar por centenas senão milhares de pessoas, imagina só a poluição que não significa.
- Mas, por exemplo, na Irlanda esse imposto já foi criado em 2002 e não foram só 5 cêntimos por cada saco mas sim 15. Cá em Portugal, se por exemplo fores ao LIDL, também tens que os pagar e sempre me lembro, de cada vez que lá vou, de ver as pessoas com as caixas vazias que por lá vão encontrando para trazerem as compras.
- Vês Luísa, a moda já não é nova, nós é que estamos habituados à fartura, por isso é que eu concordo com o pagamento dessa taxa ecológica.
- Pois tens razão Susana e se alguém quiser, que os leve de casa ou que vá de cesta, como tu disseste, para o hipermercado. Havia de ser giro tu entrares num hipermercado qualquer com uma cesta à cabeça.
- Uma cesta não direi mas um carrinho com rodas. Há-de ser mais uma maneira para eles inventarem alguma coisa que nos leve mais dinheiro.
- Meninas acalmem-se que, afinal já houve recuos na cobrança da taxa dos 5 cêntimos por saco.
- Oh D. Rosalinda, nem a ouvimos chegar. Então quer dizer que já não teremos que pagar para trazermos os sacos do hipermercado?
- Sim é verdade, mas estão em estudo campanhas de sensibilização para evitar o uso desnecessário dessas "bombas ambientais" que, ao ar livre e sem tratamento, podem demorar até 500 anos a desaparecer por completo.
- É horrível D. Rosalinda, longe de mim imaginar que um simples saco de plástico durasse tanto tempo até se desfazer.
- É verdade Luísa, mas agora, o que mais me preocupa, é termos que pagar os novos contadores que a E.D.P. quer instalar em substituição dos actuais e que custam quase 200 euros.
- Então os que temos não servem?
- Parece que não Susana, os novos são contadores de telecontagem que comunicam a leitura à distância.
- Afinal o que eles pretendem é não ter o trabalho de andar de contador em contador a fazer a leitura.
- Pois deve ser, mas não é justo que se pague uma coisa que nunca é nossa pois, o que actualmente acontece, é que descontamos todos os meses para o contador e nunca somos donos dele.
- Éh, os contadores em Portugal são muito caros, parece que andamos a pagar uma casa, só somos donos dela quando formos velhos e, se calhar, até depois de mortos a continuamos a pagar.
I

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

(RE)INSERÇÃO (A)SOCIAL

- Então Mário, alguém ficou a dever um "favaios"?
- É verdade D. Rosalinda, imagine a Srª. que, na 2ª feira, o Xavier, saiu daqui esbaforido, sem sequer pagar o que bebeu?
- Mas ele agora faz o quê?
- Olhe D. Rosalinda, até há bem pouco tempo, andava a dar serventia a pedreiro, agora parece que lhe pagam o rendimento social de inserção.
- Mas será que ele e a família se conseguem governar apenas com esse tal rendimento?
- A julgar pela aparência, tudo indica que sim.
- Olha Mário, eu não concordo nada com esse subsídio que dão a pessoas que, tal como o Xavier, ainda têm forças e idade para trabalhar.
- Oh D. Rosalinda, não seja assim tão mazinha.
- É verdade Mário, então admite-se, que quem aufere desse rendimento, se considere inapto para trabalhar?
- Bom, nessa perspectiva sou capaz de lhe dar razão.
- E tem que dar mesmo Mário. O exemplo do Xavier é óptimo para ilustrar a minha opinião. O Xavier era um pobre coitado a quem a segurança social deu a mão. Não se sabia governar, o que ganhava era todo para o vinho e os filhos em casa a gemer com a fome. Depois lá lhe arranjaram uma casita, com quartos para as crianças e com tudo aquilo que uma casa de família deve ter.
- Até aí tudo bem D. Rosalinda.
- Pois sim, até aqui tudo bem, contudo, o Xavier está nessa situação há quase um ano, não se vê que ele tenha gosto por fazer alguma coisa, mas continua a receber as ajudas da segurança social que, além de lhe entregar um dinheirão por mês, ainda lhe enchem a casa de mercearia. Diz-me só se não é uma injustiça aos olhos de quem trabalha?
- Sim, é certo, tanto mais que o Xavier podia andar aí, por exemplo, com as pessoas da PENSAR, a limpar o mato das serras ou a fazer outra coisa para, ao menos, mostrar que tem vontade de trabalhar e que merece o dinheiro que lhe dão.
- Sabes uma coisa Mário, as pessoas falam e com razão. As assistentes sociais e os responsáveis pela atribuição desses subsídios, haviam de levantar o traseiro da cadeira para ir ao local onde vivem as pessoas e avaliar a verdadeira necessidade que elas têm e até que ponto elas são realmente carenciadas.
- Tem toda a razão D. Rosalinda. Em vez de andarem para aí a pavonear-se para trás e para diante, deveriam era ir para o terreno, ver os casos de miséria gritantes que arrepiam qualquer um e, aí sim, atribuir esse rendimento a quem realmente precisa.
- Exactamente Mário, além disso, tal subsídio faz com que as pessoas que o recebem nunca abandonem os vícios que têm porque sabem que aquele é certinho e que com ele podem continuar a fazer uma vidinha sem problemas.
- Olhe D. Rosalinda, a Srª. pôs-me tão nervoso que até vou pagar já o "favaios", apesar de saber que nunca mais vou ver este dinheiro.
- Deixa lá Mário, “quem ajuda os pobres, empresta a Deus.”
- Pois sim, D. Rosalinda, pois sim.
I

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

MÍSCAROS COM ENTRECOSTO

- E a confusão ontem na feira da Espinheira?
- Deixe-me aqui D. Rosalinda. Quando vi aqueles homens todos encapuzados, com armas a tiracolo a apontar para toda a gente, confesso que fiquei de tal maneira apavorada que só me apeteceu largar tudo e vir embora.
- Mas oh Luísa, tu não achas que todo aquele aparato foi desnecessário?
- Claro que acho D. Rosalinda. Se andassem à procura de terroristas ou de indivíduos violentos ou de criminosos evadidos, ainda se compreendia, agora, chegar ali naquele preparo, a querer assustar toda a gente, só por causa de material contrafeito, acho que foi muito exagerado por parte da ASAE. Por causa disso acabei por não comprar umas calças de ganga ao meu António e o último CD do Toni Carreira, tudo por 15 euros.
- Pois minha cara, foi exactamente por causa disso que eles lá foram.
- Mas D. Rosalinda, umas calças de ganga parecidas com aquelas que eu queria comprar, não custam menos de 50 euros e o CD do meu Toni, não o trago para casa por menos de 15 euros, por isso, vale a pena aproveitar.
Nisto, chega Xavier à recepção. É um indivíduo pacato, pouco falador, e metido consigo, apenas sai do seu "casulo" quando falam do seu Benfica que, por sinal, não foi muito bafejado pela sorte neste fim-de-semana que passou.
- É assim a vida caro Xavier, quem não marca sofre.
- Pois é Mário, mas para castigo, haviam de receber o ordenado mínimo durante dois meses para saberem o que custa a vida.
- E tu Xavier, quanto é que ganhas por mês?
- Pouco mais que 500 euros.
- E mesmo assim, ainda foste ao Estádio da Luz ver o teu Benfica.
- Bem...., sabes como é, um homem não se pode privar de tudo.
- E também fumas, gostas de beber o teu copinho com os amigos e além disso a tua mulher está desempregada.
- Sabes que um homem não é de ferro Mário.
- Claro que sei Xavier, como também sei que esses vícios todos, aos quais tu (legitimamente) tens direito porque não és de ferro, não te ficam nada baratos.
- Claro que não, só quem tem dinheiro é que tem vícios.
- Mas os teus filhos andam um bocadito mal vestidos e, segundo me consta, as refeições lá em casa não são nada por aí além. Além disso deves 2 meses de renda à D. Rosalinda que, ao que tudo indica, vão passar a três.
- Olha Mário, eu não vim aqui para receber lições de moral, nem para que tu me lembres aquilo que eu devo e que posso vir a dever, por isso, aponta aí o meu "favaios" que eu vou-me embora.
E saiu disparado pela porta fora, sem pagar o "favaios" e, ainda por cima, a vociferar acerca da minha pessoa.
Parece que já o estou a ver a chegar a casa e a correr toda a gente à bofetada e ao pontapé, sem receio que dele façam queixa porque, nestes pequenos meios, "entre marido e mulher, ainda há quem não meta a colher".
- E tu Paulo, está aí há muito tempo?
- Olha meu caro, há tempo suficiente para ver que te ficaram a dever um "favaios".
- Aquele rapaz não tem emenda.
- Nem adianta estares com isso preocupado. Então e o Chávez?
- Lá levou por tabela, sinal que o povo ainda não esqueceu que aconteceu recentemente no Chile.
- E o que está a acontecer em Cuba.
- Mas mesmo assim, aquela derrota ainda não o convenceu.
- Não duvides Mário, vais ver que daqui a uns tempos vai voltar à carga.
- Na Rússia foi o esperado, com o Putin a vencer confortavelmente os seus opositores, apesar das alegadas irregularidades e das manifestações de força que antecederam as eleições.
- De lamentar meu caro Mário, de lamentar que os opositores continuem a ser calados tal como acontecia no tempo da U.R.S.S.
- Tens razão Paulo só que neste caso, é um silenciamento democrático.
- Olha, sabes uma coisa, apetece-me um "favaios", mas desta vez a pagar.
- Acompanho-te Mário, para ver se fico mais relaxado, porque o apetite já cá tenho. Sabes o que é que a Susana preparou para o jantar?
- Arroz de Míscaros, com entrecosto.
- Jura?
- A sério, só que de viveiro, claro.
- Pois, bem sei, mas ao menos servem para matar saudades daqueles que tu e eu íamos apanhar por esses pinhais fora, fossem amarelos ou pretos.
- Velhos tempos Paulo, mas desde que começaram a plantar eucaliptos por todo o lado, sem qualquer tipo de coerência, desapareceram essas e outra maravilhas que a terra nos dava.
- É o progresso meu caro.
- Claro que é o progresso, mas o progresso também não pode servir de desculpa para tudo. Não ouviste o que disse ontem o Sr. Arquitecto acerca do caos urbanístico que tomou conta de Penacova?
- E tem toda a razão, só quem manda não quer saber disso, constroiem-se depois ficam para aí às moscas como aquele edifício que foi construído junto à "Fonte do Castanheiro".
- E nas "Malhadas" também. Naquela zona só se vêm imóveis edificados em total desencontro com os já existentes e em desrespeito pela harmonia paisagística.
I

domingo, 2 de dezembro de 2007

ARQUITECTURA DESAFIADA


Foto: (c) Arquitecto

Nas minhas passagens por Penacova, como Arquitecto, não fico indiferente ao caos urbano em que, paulatinamente, se está a transformar a Cheira e os "arredores" da vila de Penacova.
As perguntas que se me colocam são muitas, mas algumas delas, pelo seu carácter dramático, erram sistematicamente em busca de respostas.
Se é certo que o progresso tem muitas caras, não me parece evidente que "este" progresso se construa ao arrepio de elementares regras estéticas e de integração na paisagem.
Quem permite estas "singularidades" arquitectónicas, espalhadas pelas encostas de Cheira e Penacova?
Bem sei que a morfologia do terreno não augura nada de fácil, mas o bom senso, nestes casos, deveria ser muito mais acautelado.
Portanto, o desafio está colocado. Ou Penacova cresce de braço dado com a sua paisagem, ou estamos a criar um "monstro" e a semear de abencerragens um lugar singular, onde deveria ser obrigatório cumprir com as regras estabelecidas pela própria natureza.
Pelo que se vê, o caminho não está a ser esse...

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

GREVE EM TRÂNSITO

-Bom dia Mário.
- Bom, dia António. Então de greve, não é verdade?
- Pois, não podemos ceder às políticas laborais deste governo.
- Mas custa um bocadito, não custa?
- Claro que custa, mas o que mais custa é estarmos a ser constantemente penalizados, quando sabemos, e vemos, que a atitude do governo em relação à contenção das despesas não é, nem de longe nem de perto, exemplar. Portanto, se os srs. ministros estão à espera de reduzir o déficit à custa do funcionário público, digo-lhe já, que comigo não contam.
- Independentemente de saber que eles não cedem nas propostas apresentadas?
- Independentemente disso. Só condeno o facto de a greve ter sido marcada para uma 6ª feira mas, espero eu, se esta não resultar, que avancem com outras mais ousadas, durante mais dias e com objectivos mais bem definidos.
- Pois é meu caro António, só assim poderão vir a conseguir alguma coisa e, mesmo assim, não sei.
- Pois nem eu, mas, em todo o caso, vamos tentando. E o que é aquilo que está a passar na televisão da pensão.
- Olha António, é sobre o festival de música do mundo que, desde 4ª feira, está a decorrer em Aveiro e que se vai prolongar até dia 1 de Dezembro.
- Interessante Mário, talvez lá dê uma saltada, pelo menos promete ser interessante, pois com o actual estado das coisas, nada melhor que uma voltinha pelo mundo, para nos esquecermos, um pouco, as misérias que grassam este país.
I

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

DERROTAS, EMPATES, REGRESSOS E DISPARATES

- Então Mário, o teu Porto não conseguiu aguentar o empate?
- Não me digas nada Paulo que eu nem estou em mim.
- Quatro bolas a uma é muita coisa.
- Tens razão, mas o que mais me revolta, é que o empate nos era suficiente e, mesmo assim, não conseguimos travar a investida do Liverpool.
- Não te preocupes meu amigo porque, pelo menos, o Benfica "salvou a honra do convento".
- Valha-nos isso meu caro, valha-nos isso.
- Vejo que andas a ler um romance?
- Olha Paulo, comprei o último livro do Miguel Sousa Tavares e pela leitura do resumo, confesso que me agrada.
- Também já ouvi falar muito bem acerca do sucessor do "Equador", mas para mim acho que são ambos muito grandes e confesso que já não tenho pachorra para ler durante muito tempo.
- O meu problema é não ter disponibilidade e, como bem sabes, aqui na recepção é difícil ler tudo de seguida, por isso, estou apenas a dar uma vista de olhos, a ler uns parágrafos, para depois, no conforto do meu quarto, ler mais amiúde este que eu espero ser um bom romance.
- Olha Mário, há dias que te ando para perguntar uma coisa?
- Então?
- Não tinhas sido convidado pela D. Rosalinda para frequentar um curso de iniciação à prova de vinhos?
- Sim, fui convidado, mas a Cristina acabou por mudar de ideias quanto à ida para a Inglaterra e o convite ficou sem efeito. E sabes que mais Paulo, até acabei por ficar satisfeito porque, aqui para nós, não me estava a apetecer muito ir para Aveiro e, além disso, mantenho-me ao pé da Cristina....
- Confessa lá Mário, tu tens um fraquinho por ela, não tens?
- Mais ou menos Paulo, mais ou menos. Desde que a vi entrar pela porta da pensão, que nunca mais fui o mesmo.
- Foi o que eu imaginei, mas ainda bem que assim é porque vocês os dois já começam a necessitar de quem vos aqueça os pés durante a noite.
- Olha Paulo, mudando de conversa, conheces o grupo que está a tocar?
- Claro que conheço, são os Madredeus.
- Exactamente, pena é que vão terminar.
- Não me digas? Um grupo daqueles, tão singular e com tão bonitas melodias, tão marcante no panorama musical português dos anos oitenta e noventa do século passado.
- É verdade Paulo, também eu fiquei chocado com a notícia, mas parece que a Teresa Salgueiro quis abraçar outros projectos e os restantes membros do grupo acharam que não fazia sentido continuarem sem ela, daí terem decidido parar por uns tempos.
- É pena que assim tenha sido mas, como é natural, só a eles cabe analisar a possibilidade de continuar com um projecto que já dura há vinte e dois anos.
- Tens razão Paulo, mas do que tenho mais saudades é daquela magnífica e incomparável voz que eu pensei poder vir a ser uma potencial candidata a ocupar o vazio deixado pela Amália.
- Deixa lá Mário, pode ser que um dia voltem, tal como os The Police, os The Who ou os Sex Pistols.
- Pois, parece que é moda regressarem passados vinte anos de terem acabado.
- Sabes como é, existem sempre aqueles saudosistas que nunca esqueceram os momentos que tais bandas lhes proporcionaram e, além disso, tal regresso sempre serve para, quem sabe, equilibrar as contas. Além disso as editoras discográficas estão sempre à espera de ganhar mais uns cobres.
- És capaz de ter razão Paulo, param durante uns anos e depois regressam mais velhos, claro, mas com força suficiente para fazer vibrar os fãs e ainda para venderem uns milhares de cópias dos álbuns que entretanto editarem.
- É a prova de que, quando se quer alguma coisa, consegue-se sempre alcançá-la, a não ser, claro, que a saúde nos atraiçoe.....

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

SÓ DE IMAGINAR A VOLATILIDADE...

- Olha Susana, só de imaginar a situação daquela mulher a ser agredida por um brutamontes sem se poder defender, fico toda a tremer.
- Também eu Luísa, nem consigo imaginar como me comportaria numa situação dessas, acho que desatava a fugir e só parava quando não visse ninguém atrás de mim.
- Já nem numa sala de espera de um hospital se pode estar em segurança, isto não é normal num país de "brandos costumes" como gostamos de ser intitulados.
- Pois é Cristina, mas a verdade está à vista e não há volta a dar, parece que estamos no Far West, onde impera a lei do mais forte.
- Paira sobre nós uma sensação de insegurança e que se tem vindo a alastrar por todo o país, pelo menos é o que dizem os jornais.
- Sabes Luísa, tudo isto é o reflexo da crise que estamos a atravessar. As pessoas vêm-se sem dinheiro, sem emprego e sem futuro. A continuar assim, muitos lares vão ficar sem o bacalhau ou o peru do Natal.
- Tens razão Susana, imagina tu que até os patrões se estão a associar aos sindicatos para se manifestarem contra o (inevitável) encerramento das suas empresas, facto inédito no mundo esta derradeira união. Nunca em algum país se sentiu tanta necessidade de travar a crescente degradação do tecido económico do país.
- Olhem meninas, vim agora da recepção e, imaginem só, que está a passar na televisão da pensão um filme sobre um fantasma que apareceu numa estação de serviço do Ohio, Estados Unidos.
- Cruz credo D. Rosalinda, que até me estou a arrepiar toda só de pensar nessas almas penadas.
- Olha Luísa, se calhar também eles necessitam de combustível para se deslocar.
- Não vá mais longe D. Rosalinda, eu tinha um amigo que quando estava mais divertido, dizia que “só lhe apetecia beber gasolina e acelerar”.
- Então deve ter sido por isso que aquele fantasma escolheu aquele local para se revelar Cristina, mas como não tem recipiente, anda por lá a a ver se, pelo menos, consegue sentir a volatilidade dos gases.
I

domingo, 25 de novembro de 2007

BENFICA, PORTO E OUTRAS EMERGÊNCIAS

- Bom dia menina Alice.
- Bom dia Mário.
- Então menina Alice, correu bem o encontro de coros?
- Não correu mal Mário.
- Pelo menos, a julgar pela quantidade de carros que se encontravam no Terreiro, parece que tiveram uma plateia bem composta. E, além disso, já o salão estava aberto, com as luzes já acesas, tudo arranjadinho, o que só prova que em Penacova, o jazz não é apadrinhado pela classe política, embora se compromentam a fazer, atabalhoadamente, a sua divulgação.
- Sim, é verdade Mário mas, além disso tudo, as camisolas que o muicípio ofereceu desta vez, eram apenas camisolas e não vestidos, como no ano passado.
- Ainda bem que assim foi.
- Não foste lá Mário?
- Não menina Alice, preferi ficar aqui na pensão a ver o Benfica, ou melhor, a Académica, aquele grande clube.
Bom dia a todos, disse o Paulo quando entrou.
- Bom dia. - respondemos
- Então Mário, o Benfica lá ganhou à Académica!!!
- Parece que sim meu caro, para muita pena minha.
- Deixa lá que o Porto vai ganhar ao Setúbal.
- A ver vamos, a ver vamos.
- Então Paulo, que mandas?
- Olha, pode ser um café curto e um pastel de Lorvão.
- E novidades?
- Olha, fiquei contente por saber que o Paquistão foi suspenso da Commonwealth até regressar à democracia.
- Então, isso é fácil, agora o Musharraf vai chegar ao parlamento paquistanês e diz: "Meus amigos, a partir de agora, somos uma democracia" e ficam satisfeitas as exigências daquela comunidade e o Paquistão vê assim, pela segunda vez, a sua suspensão levantada.
- Sim, é mais ou menos assim que funciona mas, o que a Commonwealth devia ter logo feito, era impedir, ou pelo mesmo manifestar o seu repúdio, quando o Musharraf decidiu alterar as regras da democracia para se eternizar no poder decretando para isso o estado de emergência.
- E por cá meu caro amigo?
- Olha Mário, por cá achei interessante a entrevista dada ao Expresso, pelo Inspector-Geral da Administração Interna, Clemente Lima.
- Éh, eu também achei interessante, interessante e preocupante.
- Ainda há muita coisa que aqueles que são pagos para zelar pela nossa segurança têm que fazer para que nos inspirem confiança
- Olha Paulo, tenho um amigo que nunca foi à tropa, nunca disparou uma arma de fogo e, quando acabou o curso de polícia, mandaram-no para a rua fazer patrulha com uma arma à cinta com a qual apenas tinha dado tiro duas vezes. Diz-me só se esse agente da autoridade, estava em condições de defender alguém ou de se defender a ele?
- Não se admite que as coisas sejam encaradas assim com tanta ligeireza. Depois é o que se vê, mortes acidentais, tanto de um lado como do outro, excesso de autoridade com as tendências violentas que lhe estão adstritas e, por fim, o excesso de corporativismo que impede o apuramento de responsabilidades.
- É muito complicado. Então e aquele sujeito que estava aqui na quinta-feira a falar contigo acerca do caso Esmeralda?
- Aquele que reflectiu duas vezes sobre o assunto?
- Sim Mário esse, por acaso achei interessantes as posições dele acerca do assunto. Revelou-se uma pessoa esclarecida e com opinião formada, pena é que não tenha dito quem era.
- Pois é Paulo, às vezes é assim, aparecem, conversam um pouco e depois vão-se embora sem sequer dizer quem são.
- Pode ser que volte.
- Pode ser que sim, é sempre agradável ter um interlocutor tão esclarecido.
- E talvez até se identifique.
- Isso era óptimo Paulo, isso era óptimo.
- Olha Mário, que interessante, só agora reparo que na televisão da pensão está a passar mais uma daquelas iniciativas levadas a cabo pela Greenpeace para, mais uma vez, alertar o mundo para o problema do aquecimento global.
- Sim Paulo, é mais uma tentativa das muitas que aquele organismo leva a cabo para alertar ou sensibilizar, os poderosos.
- Sabes Mário, eu acho que os poderosos não são sensíveis a esse ponto, infelizmente.
I

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

CANTORIA DA LEGALIDADE

- Avó, posso fazer-te uma pergunta?
- Claro que sim minha filha.
- Achas que a menina Esmeralda vai ficar bem o pai biológico?
- Bom minha querida, as crianças devem estar sempre com os pais, biológicos ou não, desde que eles as eduquem, não as maltratem e nem delas abusem.
- Então, nesse caso posso concluir que concordas com a decisão do tribunal?
- Se estiver de acordo com a legalidade, sim, concordo.
- É interessante essa coisa da legalidade... Quer dizer então,
que os sentimentos das pessoas, aos olhos da Lei, pouco importam, não é?
- Olha minha querida, eu não sou jurista, mas acho que, se todas as pessoas tivessem a oportunidade de considerar de sua propriedade um ser humano que, biologicamente, sabem não lhes pertencer, creio que estaria aberto um precedente.
- Desse modo, o caso da pequena Esmeralda pode servir de exemplo?
- Sim, talvez para prevenir situações futuras.
- Olha avó, queria perguntar-te outra coisa.
- Hoje estás muito perguntadeira, o que queres saber?
- Achas que os meus pais vêm cá este Natal?
- Olha minha filha, espero que no Natal e no Fim-de-Ano.
- Estou com muitas saudades deles, dos carinhos do papá e da mamã....
- Está descansada que virão, aliás, como sempre fazem.
- Espero por eles a toda a hora.
- Também eu minha filha, também eu.....e por falar em hora, não achas que já devias estar na cama?
- Já é tarde, tens razão avó, mas ainda tenho que ir treinar um pouco a minha voz.
- Oh filha, olha que amanhã tens que te levantar cedo e, além disso, sabes como fica a Luísa quando tu a acordas com as tuas cantorias.
- Mas avó, a actuação é no Sábado às 21 horas e, começo a ficar nervosa.
- Não te preocupes com isso porque, até lá, ainda vais ter muito tempo, além disso estás a ficar constipada e tens que ir para a cama logo depois de beberes o leite quente com mel.
- Tens razão avó, acho que vou mas é descansar.
- Mas olha, se cantares, canta só para ti.
- Está bem avó, um beijo.
I

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

DIPLOMACIAS

Quando pernoito na Pensão Viseu, dou comigo a pensar na actualidade, longe do ruído mediático que tanta poluição faz.
Este sossego do quarto explica-me quão hábil tem sido a diplomacia lusitana a lidar com o senhor das venezuelas, esse grande democrata que, finado Fidel Castro, será o novo líder do mundo livre e justo.
Fizémos acordos para todos os gostos, com os 400 mil emigrantes e o escuro petróleo a patrocinarem as assinaturas e a intervalarem as batatas com bacalhau.
Os comentaristas/moralistas do regime trataram de excomungar o senhor Chávez e o Governo português, numa atroz falta de sentido patriótico, ainda as criaturas não tinham parido tão importantes acordos.
O interesse da nação portuguesa sobrepõe-se, obviamente, à pequena e reles trica diplomática, aos meandros semi-explicados do exercício do poder por parte do presidente Chávez. Isso é secundário por cá e genuinamente doméstico do lado de lá do Atlântico. Do lado de cá, tratamos dos nossos problemas com a sageza costumeira e com a visão profética e salvadora que este governo vem demonstrando cristalinamente de há dois anos e meio para cá.
Tudo o resto é espuma e sujidade que esta chuva e uma vassoura devolverão ao local apropriado!

terça-feira, 20 de novembro de 2007

CHEIAS REAIS

I
- Afinal D. Rosalinda, a chuva não fez muitos estragos para a nossa zona.
- Pois não Mário, mas no Alentejo o mau tempo ainda provocou umas quantas inundações.
- Em todo o caso D. Rosalinda, o verdadeiro Inverno ainda não começou, embora as autoridades alertem para a possível ocorrência de situações adversas até amanhã.
- É perfeitamente natural que isso venha a acontecer mas, mesmo que aconteça, nunca se irá comparar aos rigorosos Invernos que ocorriam quando eu era mais nova.
- A Srª. lembra-se como eram esses Invernos?
- Óh se lembro, era tanta a chuva que as margens do Mondego invadiam as ínsuas quase entrando pela porta das casas dentro.
- Por falar nisso D. Rosalinda, ainda há pouco, quando estava a dar uma olhada nas minhas fotografias antigas, peguei numa que retratava precisamente essa época. Nela, a "Barca do Concelho" aparece rodeada de água como se duma ilha se tratasse.
- Deixe ver se me recordo Mário.
Pegando na foto, a D. Rosalinda quase chorou, não pela fotografia em si, mas pelas memórias que lhe traziam aquela imagem.
- Olha Mário, neste tempo, apenas as barcas conseguiam garantir o transporte das pessoas, eram épocas em que a pobreza ainda era uma constante, principalmente junto às zonas ribeirinhas. Hoje, com a Barragem da Aguieira tudo mudou, as cheias já não nos afectam tanto, os caudais são controlados e, claro, as pessoas andam mais descansadas.
- Mais descansadas diz a Srª., olhe que quando os técnicos fazem estimativas, muitas das vezes são apanhados desprevenidos porque não contam com a imprevisibilidade da natureza, não conseguindo por isso evitar o pior.
- Tens razão Mário, basta recordarmos o que aconteceu no Baixo Mondego em 2001 para percebermos que a natureza, às vezes, nos prega umas partidas, revelando toda a sua força e capacidade destrutiva.
- E o que é que acha relativamente à fotografia?
- Queres a minha opinião?
- Claro que sim D. Rosalinda.
- Acho que fica muito bem ao lado das outras que, na pensão, mostram as paisagens e os locais de interesse de Penacova.
- Também achei que sim mas primeiro pretendia ouvir da sua boca essa sugestão e, nesse caso vou já tratar de a emoldurar para depois a pendurar.
I

domingo, 18 de novembro de 2007

SÓ MESMO UM PADRE

- Parece que afinal vamos ter chuva amanhã.
- Finalmente vamos poder poupar um pouco mais de água D. Rosalinda.
- Olhe Mário, eu não sei onde é que isto ia parar se não chovesse por estes dias.
- Ainda não é certo mas, a julgar pelas previsões, as chuvas vão ser persistentes e fortes as rajadas de vento.
- Tomara que não venham estragar mais do que aquilo que possam vir a arranjar, pois estas chuvas tardias tendem a levar tudo por diante.
- Bem D. Rosalinda, os solos estão secos e nus e, quando assim é, as primeiras chuvadas arrastam as terras mais soltas e, em alguns casos, causam graves derrocadas e inundações.
- Pode ser que não Mário mas, à conta disso, ainda vou rezar o terço, não vá o diabo tecê-las.
Entretanto, na sala de refeições já a Cristina ultimava as mesas para o jantar. Bonitos candelabros, os melhores talheres e a melhor louça. Os vinhos já se encontravam a respirar como se esperassem a hora certa para acompanhar o cherne no forno com batatas aloiradas e uns grelinhos de nabo ou o cabrito assado no forno à padeiro que a Susana já tinha pronto a servir e cujo cheiro nos fazia crescer água na boca.
- Então Cristina esperamos por alguém importante para o jantar?
- Nem por isso Mário, se bem que hoje à tarde, dois sujeitos que não se quiseram identificar, perguntaram se era possível reservar uma mesa para o jantar.
- E não se identificaram?
- Tiveram que o fazer pois, se assim não fosse, não era possível fazer a reserva.
- E disseram os nomes?
- A mesa ficou em nome de Paulo Durão e fizeram questão de frisar que a queriam num espaço reservado da sala de jantar.
- Paulo Durão.....esse nome não me diz nada, se bem que o último me é familiar.
Se mais depressa perguntasse, mais depressa obtinha a resposta. Entraram na pensão dois sujeitos trajando com gabardina, do estilo daquelas com que os detectives se vestem. De imediato nelas peguei e com, a mesma rapidez, fui colocá-las no vestiário da pensão, cuja porta directa fica mesmo ao pé da recepção. Para meu espanto, constatei que o nome que deram à Cristina, aquando da reserva da mesa para o jantar correspondia ao primeiro e último nome de cada um deles.
- Boa noite. - disseram eles quando chegaram à recepção
- Boa noite. - respondi educadamente
- Vínhamos para jantar - disse o que tinha menos cabelo e que procurava com o pouco que lhe restava, cobrir a cabeça toda.
- Reservaram mesa?
- Sim, reservámos.
- Então façam o favor de me acompanhar.
- Olhe, se não for muito incómodo....
- Diga, diga.
- ...Se não for muito incómodo gostaria de lhe perguntar se por acaso não têm por aí uma fotocopiadora? - perguntou o que se chamava Paulo
- Fotocopiadora, scanner, fax, internet, tudo que os senhores desejarem.
- Óptimo. - respondeu alegremente.
- Só mais uma questão. - perguntou o que se chamava Durão
- Faça o favor de dizer.
- Por acaso seria muito descabido perguntar-lhe se era possível falar com um padre?
- Com um padre???
- Sim, com um padre!!!- Mas para que quer um padre a estas horas???
- Olhe meu caro, necessito de alguém que me ouça e me perdoe. - respondeu o Durão
- Mas porquê???
- Porque, não há muitos anos, fiz uma má interpretação de uma informação que me deram e, com essa interpretação, contribui para instalar o caos numa região do globo bastante cobiçada e para que milhares de pessoas fossem mortas e ainda possam vir a morrer.
- Pois, compreendo que deverá estar com um grande peso na consciência. E já agora, o seu amigo não quererá aproveitar a vinda do padre para, também ele, se possa redimir de alguns pecados que tenha cometido?
- Não, para ele não é preciso.
- Como assim? – perguntei admirado
- Não é preciso porque ele (ainda) goza de imunidade parlamentar.
- Percebi muito bem, até bem demais, vou já tratar de lhe arranjar um padre e, se calhar, também um sacristão.
I

COLABORADORES PRECISAM-SE

No âmbito da inauguração, ontem no Porto, da maior árvore de natal da Europa, foi divulgado o seguinte aviso:
Por motivos relacionados com a forte pressão para que o Natal vá sendo gradualmente antecipado, até (idealmente) coincidir com a festa de aniversário de cada português, o chefe de gabinete de um dos ministérios do governo da Lapónia, informa todos os interessados (carteiros, preparadores de embrulhos, renas, duendes, anjos, fadas e indiferenciados) que se encontram abertas inscrições para auxiliares do Pai Natal, pelo período de 10 dias úteis a contra da publicação do presente aviso.
Tais candidatutas deverão ser enviadas, por carta registada com aviso de recepção, para o gabinete de recursos humanos do ministério dos assuntos lucrativos, até ao próximo dia 30 do corrente mês, sob pena de exclusão.
I

sábado, 17 de novembro de 2007

NÃO HÁ MISÉRIA QUE NÃO DÊ EM FARTURA

- São cansativas estas idas a Coimbra ao hiper-mercado, não são D. Rosalinda?
- Podes crer que sim Luísa, que o digam os meus joanetes.
- Mas, segundo sei, vamos ter para breve dois novos supermercados para abastecer Penacova.
- Ai sim Luísa, onde?
- Olhe D. Rosalinda, um vai abrir na Espinheira, junto ao nó do IP 3, e outro vai começar a ser construído na "Quinta do Peixes", junto à zona escolar de Penacova.
- Que maravilha Luísa, assim já não temos necessidade de ir a Coimbra às compras.
- Às compras de produtos alimentares claro está, porque há outras compras que não podem deixar de ser feitas lá.
- Logicamente Luísa, até porque gosto de ir a Coimbra comprar vestuário e calçado, além disso a menina Alice adora ir para aqueles lados de Taveiro, ao Retail Park porque, diz ela e muito bem, há mais variedade e os preços são mais acessíveis.
- E tem razão D. Rosalinda, ante de comprar devemos comparar preços e, em Penacova, embora já existam vários estabelecimentos comerciais, os preços não variam muito entre uns e outros, já para não falar no risco que se corre quando pensamos que comprámos alguma coisa única e, quando saímos da loja, parece que pertencemos a uma irmandade qualquer, tal é a quantidade de pessoas que pensa que comprou uma coisa única e original.
- É um dos problemas dos meios pequenos, por isso é que temos que, inexoravelmente, continuar a ir às compras a Coimbra.
- E aquele terramoto que assolou Bangladesh na passada quinta-feira?
- Horrível Luísa, só de imaginar o sofrimento constante de todas aquelas pessoas.
- O mundo está para acabar D. Rosalinda.
- Pelo menos para aquelas 1723 pessoas que, até agora, já perderam a vida, já acabou.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

VALIA MAIS TRINCAR A LÍNGUA

- Não são todos os dias que se fazem 85 anos, pois não Cristina?
- Pois não Mário, e eu que apenas lhe dava uns 70 e poucos.
- Eu também nunca imaginei que fosse assim tão "usado", sim porque velhos são os trapos.
- Está com uma carinha laroca sim senhor e, além disso, escreve que é uma maravilha.
- Boa noite Susana, ainda bem que vieste, também gostas de Saramago?
- Olha Mário, as leituras para mim resumem-se a assuntos relacionados com comida e a sua confecção porém, confesso que José Saramago é uma figura incontornável da nossa história actual, com inúmeros reconhecimentos literários, entre os quais, aquele que lhe deu mais projecção mundial.
- O Nobel da Literatura em 1998. - disse a menina Alice
- E não só - disse a Susana -, também ganhou o Prémio Camões em 1995. Assim, movida pela curiosidade, porque quem é alvo de tanto reconhecimento tem que ser muito bom, decidi dar uma olhadela em alguma das suas obras.
- Mas olha Susana - disse eu -, este dia significa muito para a vida daquele senhor e também para todo o povo português, não só pelo facto dele próprio ser nosso compatriota, mas também por contribuir para a divulgação e engrandecimento da língua portuguesa e do seu povo, contudo, algo, ou melhor, alguém o manchou com declarações quase ofensivas à língua de Camões.
- Não percebo onde queres chegar? - disse a Susana
- Eu vou explicar melhor. Um dia, como o de hoje, com tanto significado para a língua portuguesa ficou manchado com as declarações do presidente Bush, a propósito dos cortes orçamentais que ele considera serem necessários fazer.
- E então Mário? - perguntou a menina Alice
- Vai daí, aquele presidente vetou uma proposta orçamental apresentada pelo partido democrata, alegando que, entre outras coisas igualmente supérfluas, um programa de português como segunda língua era perfeitamente dispensável. - expliquei
- Quer dizer então, que para aquele Senhor, tudo que cheire a cultura é de dispensar? - pergunto indignada a menida Alice
- Exactamente - disse eu -, para aquele indivíduo, tudo o que não seja Iraque e Irão, não deve ser tido em consideração.

DEONTOLOGIAS DE 2ª TEMPORADA

Eram quase horas de fechar. O Paulo e eu estávamos a saborear o último trago de whisky que ainda restava no copo. Para trás, ficou a conversa sobre o (novo) braço-de-ferro que envolve a ordem dos médicos e o ministro da saúde.
Os dois tínhamos os olhos postos na televisão, a ver a "2ª temporada" da série "TheLword".
- Simpáticas as raparigas!!! - exclamou o Paulo
- Simpáticas e jeitosas. É pena não gostarem de homens. - respondi
- Porquê? - perguntou o Paulo -. Se por acaso gostassem de homens, achas que vinham ter aqui à pensão?
- Claro que não - respondi -, faz-me é um bocado de confusão.
- Olha...não te rales com isso e acaba de beber o pouco que já tens no copo, para irmos embora.
- Tens razão, mas já agora espera para vermos até ao fim. - disse eu
- Bom, nesse caso acompanho-te noutra bebida, porque parece que vai demorar.
I

terça-feira, 13 de novembro de 2007

OS CAPRICHOS DO MINISTRO

O Luís acabava de chegar à pensão, vindo acompanhado pelo António. Ambos são funcionários públicos e, desde que provaram os magníficos pratos confeccionados pela Susana e depois de saberem que a Cristina era especialista em vinhos, tornaram-se clientes habituais da pensão. Almoçavam, quando calhava, jantavam e, de quando em vez até pernoitavam. Pelo semblante carregado que traziam, reparei que não vinham para muitas falas e, como bom recepcionista que pretendo todos os dias ser, apenas lhes dei as boas-noites sem esperar alguma resposta, que inesperadamente acabou por vir. Educadamente, acompanhei-os à mesa onde habitualmente gostam de estar, quer seja ao almoço ou ao jantar.
- Inadmissível Luís, uma coisa nunca vista!!!!
- Tens toda a razão António, e o mais caricato de tudo é que isto só acontece normalmente naqueles países africanos, com muitas riquezas no subsolo e com níveis de desenvolvimento e educação muito baixos. Nesses países é que os governantes, enquanto exigem ao povo que representam, contenção nas despesas, maior flexibilização das regras laborais, com a consequente precariedade do vínculo laboral e lhes dão cada vez mais piores remunerações, exibem os mais recentes modelos, quer de automóveis, quer de "gadgets", quer de fatos feitos por costureiros famosos, como se de uma demonstração de uma passarele se tratasse.
- E o mais ridículo e insuportável de tudo, é tratar-se de um governante cujo ministério que tutela é um dos que menos condições oferece, tanto aos funcionários que para ele trabalham, como aos contribuintes que, por obrigação, têm que frequentar os serviços públicos do seu ministério.
- Não vás mais longe António, no tribunal da nossa terra, os funcionários que lá trabalham, de tão pouco e miserável espaço que têm, estão em cima uns dos outros e movem-se com extrema dificuldade, tal é a confusão em que aquilo se encontra. Tu por acaso achas que uma qualquer empresa privada conseguiria o alvará necessário para laborar, se por acaso a sua sede tivesse aquelas condições? Nunca na vida!!!
- E anda um ministro desses num automóvel topo de gama, quando o contribuinte que lhe paga o ordenado a fim do mês, tem que andar a pé ou porque não tem dinheiro para o combustível, ou porque não tem dinheiro para o bilhete do comboio que, ao que sei, vai aumentar mais 30 cêntimos.
- Mas Luís, o edifício onde está instalado o Tribunal de Penacova, nem sequer pertence ao ministério da justiça.
- Áh não, então a quem pertence?
- À autarquia, claro!!!
- Então nesse caso, também tem "culpa no cartório".
- São tão bons uns como outros e, quando o assunto não interessa, sacodem a água do capote e saiem, ou pensam que saiem, ilesos da situação.
- Mas António, também está para breve o fecho do Tribunal em Penacova, não está?
- Claro que está Luís, mas o que mais me espanta, é que ninguém diz nada, ninguém apresenta soluções ou alternativas, admira-me, por exemplo, um concelho como o de Vila Nova de Poiares, com uma área menor à da freguesia do Lorvão, consegue em cerca de 5 anos, instalar na sede do concelho, um julgado de paz e uma esquadra de polícia municipal!!!
- Sabes porquê António, porque o Jaime Soares não se chama Maurício e, ao contrário do nosso, tem feito por aquele concelho o que este nunca faria, nem que estivesse lá a vida toda.
- Tens razão Luís, o concelho de Vila Nova de Poiares tem uma pujança que o de Penacova nem daqui a vinte anos consegue alcançar.
- E sabes porquê António, porque os que governam em Poiares são de lá e gostam de lá estar, fazendo daquele concelho um sítio agradável, enquanto os daqui são uns palermas, sempre ao olhar para o relógio a ver se chegam as horas para se irem embora.
- Podiam era ir-se embora definitivamente em vez de andarem para aí a tentar colocar piso sintético nos campos de futebol, como se isso fosse sinónimo de progresso.
- Mas não vão porque os penacovenses são uns tótós, se lhe derem umas concertinas, uma castanhas e uns pipos de vinho para se entreterem, não pensam em mais nada.
- Olha Luís, quando vim trabalhar para Penacova, há já vinte anos, gostei muito da terra quando cá cheguei. Muito pacata, como belas paisagens e gente simpática. Passados esses anos todos, continua a ser muito pacata, a ter belas paisagens e as pessoas continuam a ser simpáticas.
- Sabes António, é para não te desabituares.

ALIVIANDO A ESPERA

A menina Alice já vinha pedindo há uns tempos, que a D. Rosalinda providenciasse pela colocação de um televisor na recepção da pensão, para que os hóspedes não desesperassem enquanto esperavam. Sabia perfeitamente quão dura era a espera daqueles que aguardavam a sua vez, fosse para o restaurante, fosse para o S.P.A. da pensão onde, neste caso, teriam ainda que aguardar a realização de um check-up, o que naturalmente causava alguma irritação. Além disso, as crianças também gostavam de ter ali algo que as mantivesse, por momentos, distraídas, coisa que os pais muito agradeciam.
- O que é que acha Mário?
- Acho que é uma boa ideia D. Rosalinda. Uma televisão na recepção da pensão pode ser útil para quem gosta de estar informado, enquanto espera de ser recebido. Além disso também existe a possibilidade de mostrar vídeos relacionados com a nossa terra e as suas riquezas e com os eventos que nela possam vir a ocorrer, apesar de não serem muito frequentes.
- Também acho que sim. A minha neta tem muito jeito para o negócio, não acha Mário?
- Tenho a certeza que sim, aliás está-lhe no sangue e, como diz o ditado, "filha de peixe sabe nadar".
- Além disso Mário, agora que me lembro, também pode ser muito útil para informar os hóspedes das condições de alojamento e das actividades que a pensão pretende levar por diante durante o ano.
- Naturalmente que sim D. Rosalinda, tem inúmeras vantagens e, quando achar que não resulta, basta retirá-la do local em que se encontra.
- Exactamente Mário.
Entretanto chega o João, meu companheiro de há anos, sempre com disposição para falar um pouco de política e não só de política claro, mas principalmente acerca dela.
- Já reparaste na nova televisão da pensão?
- Sim Mário, já reparei, fica muito bem no sítio onde está.
- Foi ideia da menina Alice, disse à avó que os hóspedes necessitavam de algo que os distraísse enquanto esperavam e pronto, aí está!!!
- Fez muito bem. Agora reparo que estão a mostrar as imagens do puxão de orelhas que o rei de espanhol deu ao presidente venezuelano, engraçado como ainda existe coragem para manifestar (publicamente) algum descontentamento.
- Pois é Mário, independentemente de ter existido uma relação quase umbilical, ou melhor, colonial, entre uns e outros, não deixa de ser curioso que aquele ímpeto paternalista falou mais alto.
- Acerca disso João, li um texto publicado num blog que habitualmente visito e o retrato que é feito de Chávez não engana. O homem é mesmo "atravessado de gineto" e com aquele comportamento, só empurra o povo para o isolamento internacional e para o abismo do socialismo cubano que todos sabemos o que é, e no que deu.
- Mas também não é muito correcto da parte de sua majestade, repreender um público um chefe de estado.
- Claro que não João, mas talvez o chefe de estado a que te referes, não esteja assim tão preparado para o ser, tendo apenas do lado dele uma das maiores reservas petrolíferas do mundo e uma (grande) parte do povo habituado a viver com mão-de-ferro e na miséria.
- Mas, convenhamos que com o eminente desaparecimento de Fidel, o homem tem necessidade de se afirmar como o novo rosto do comunismo na América Latina e, nada melhor do que o fazer à custa de atitudes descabidas e excessivamente populistas.

domingo, 11 de novembro de 2007

TARDES CONSOLADAS

Sempre que passo aqui pela Pensão, converso com a menina Alice.
É uma jovem que por norma me esclarece algumas dúvidas que tenho, mesmo que isso possa parecer estranho.
Há dias, numa conversa com ela, perguntei-lhe:
- Alice, vais ao magusto no Largo do Terreiro, no próximo domingo?
Alice foi rápida e certeira...
- Eu não! Deus me livre. Aquilo é para os velhotes!
Gelei.
Ainda assim, arrisquei tentar fazer-lhe ver as coisas de outro prisma.
- Repara, Alice, acho que não tens razão. Não está escrito em lado nenhum que "aquilo é para velhotes". O magusto é um espaço de convívio, inserido numa "Feira do Mel" e que já é uma tradição aqui em Penacova. E é triste que uma jovem como tu esteja já a atribuir rótulos a um acontecimento que, por muito criticável que possa ser, é para respeitar. Há muitas pessoas que esperam todo o ano por este dia, não só para a feira do mel, como para comer umas castanhas, conviver, enfarruscar a cara e beber uma água-pé!... E já agora, o que vais ficar a fazer?
Alice demorou uns segundos a arrumar a sua cabeça que, por momentos, deu a ideia de ter sido algo desarrumada com o que lhe disse.
- Olhe, vou ficar em casa a jogar consola e depois vejo um filme na televisão!
Alice desarmou-me. Não que achasse o seu plano para a tarde uma glória, não! Acho até que é uma prática comum aos jovens que vivem agarrados às consolas, não convivem, não se entusiasmam e se fecham num pequeno círculo existencial, dentro das divisões de uma casa, parados, pouco reflexivos, enfim...
Mas se calhar sou eu a exagerar na análise e isto não passa de um sinal destes tempos, sendo que me apresento, assim, como um bota de elástico e sem piada nenhuma!

sábado, 10 de novembro de 2007

CASTANHAS AO DESAFIO

I
A Luísa já andava numa lufa-lufa terrível. Subia e descia as escadas da pensão como uma velocidade tal que eu julguei tratar-se de alguma urgência.
- Então Luísa, porque corres?
- Olha Mário, porque tenho que ter tudo pronto até às 11 horas.
- Mas vais a algum lado?
- Claro Mário, tenho que ir às compras com a D. Rosalinda, buscar as castanhas ao Chainho, dois centos de pastéis a Lorvão e outros dois centos de Nevadas à Ronqueira.
- Então, mas isso é óptimo, estará relacionado com o magusto de amanhã.
- Sim Mário, deve estar porque, além do magusto, também vêm os representantes da Casa do Concelho de Penacova, em Lisboa e sabes como a D. Rosalinda é, faz questão de lhes oferecer o almoço...
- A preços módicos, claro.
- Sim, como é óbvio, e também gosta de lhes oferecer a doçaria característica do nosso concelho.
- Pois, a ser assim, vocês as duas têm muito que fazer.
- E sabes que mais Mário, agora com carta de condução, sou o braço direito da D. Rosalinda, que nada faz sem que eu ande sempre atrás dela.
- Pois fazes muito bem Luísa, porque a D. Rosalinda é boa senhora e nós temos que lhe estar muito agradecidos.
- Tens razão Mário e tu bem sabes que, enquanto vivermos, temos para como ela uma grande dívida, por isso, tudo o que ela quiser, será por mim satisfeito com todo o prazer.
- E jeropiga, sabes de alguma coisa Luísa?
- Ceio que a Cristina já está a tratar disso.
- Claro que está, e não só da jeropiga como também da água-pé. Que bem que sabe uma boa jeropiga e um (ou dois) copo de água-pé quando estamos a comer castanhas.
- E além disso Mário, ainda vamos ter o Ruizito e as Raízes do Minho, banda que o acompanha.
- Então vai ser um festa engraçada, com aquele rapaz a puxar pela assistência para cantarem com ele à desgarrada.
- Estou convencida que sim, até o meu António cá vai estar. Ele adora estas coisas tradicionais.
- Pronto então Luísa, vai lá com a D. Rosalinda às compras e façam boa viagem, que eu vou tratando das coisas por aqui.
I

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

PINGO NO NARIZ

A D. Rosalinda regressava do jardim com o cesto de jardinagem, que habitualmente leva quando para lá vai, cheio de bonitas rosas. Trazia um pingo no nariz, sinónimo de que estava a ficar constipada.
- Então D. Rosalinda, parece que está a chocar alguma?
- Acho que sim Mário, este tempo mais fresco apanhou-nos desprevenidos e de um momento para o outro, ficamos com arrepios de frio pelo corpo todo.
- Mas olhe que o mau tempo está a afectar grande parte da Europa, pelo menos os meios de comunicação deram notícia de que se esperam para hoje grandes inundações devido a uma forte tempestade no Mar do Norte, que atingiu também a Alemanha e a Escandinávia.
- Também ouvi qualquer coisa acerca disso. O clima está todo mudado e sabe quem eu culpo Mário, aqueles americanos que se recusam a assinar o Protocolo de Quioto.
- Tem toda a razão D. Rosalinda, são eles e outros que, tal como eles, sacrificam o saúde do planeta só para não colocarem em risco a sua riqueza.
Nisto, entra o Daniel, homem que já conhecem por ser quem abastece de gás a pensão. Também ele entrou na conversa, manifestando a sua preocupação com estas alterações de clima.
- E nessas inundações ninguém se magoou ou teve necessidade se ser evacuado por via aérea? - perguntou
- Não Daniel, creio que não. - respondi
- Ainda bem que não porque, caso isso tivesse acontecido em águas territoriais portuguesas, o evacuado teria que preparar uma boa quantia para pagar ao Estado.
- Como assim Daniel? - perguntou a D. Rosalinda.
- Então a Srª. não quer saber que a Força Aérea Portuguesa apresentou uma factura de 13.000 euros a um indivíduo que, em Outubro de 2002, foi por eles resgatado de alto mar.
- Mas isso é ridículo!!! - exclamou a D. Rosalinda
- É ridículo mas aconteceu. - disse o Daniel
- Talvez por temerem o não pagamento da operação de salvamento, é que não fizeram atempadamente a evacuação dos tripulantes da embarcação "Luz do Sameiro". - conclui
- Ou então, trata-se de mais uma forma que o governo de Sócrates arranjou para reduzir o déficit. - disse a D. Rosalinda.
- Todos os dias há-de aparecer alguma coisa que nos faça suspeitar das "boas intenções" dos nossos governantes.
- Tens razão Daniel - respondi -, ainda ontem, por exemplo, o reitor da Universidade de Lisboa, veio a terreiro denunciar uma situação em que o governo português dá mais dinheiro às universidades estrangeiras, do que a algumas portuguesas.
- E depois andam sempre a aumentar as propinas, a dizer que as universidades têm que se transformar em fundações e que o Estado não pode andar a subsidiar constantemente os estabelecimentos de ensino. - disse a D. Rosalinda.
- Este país caminha não sei para onde, com os governantes a exigirem aos portugueses cada vez mais contenção e as coisas a aumentarem cada vez mais, começando pelo petróleo e acabando...
- No gás Daniel.
- Exacto D. Rosalinda, no gás.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

À MESA COM GREVE

- Não me digas que, desta vez, não vais aderir à greve geral do dia 30?
- Ainda não sei António, provavelmente nada vai adiantar.
- Pois é Luís, a pensar assim é que nunca vai resultar.
- Mas ouve lá António, tu não achas que um único dia de greve geral é pouco?
- Bom, não acho que seja muito, mas é necessário transmitir a mensagem de união e descontentamento ao governo.
- Sim, podes ter muita razão, mas união e descontentamento sem resultados práticos, não levam a lado algum. Se fosse uma greve que paralisasse os serviços durante uma semana, aí sim, era vê-los a vir comer à mão dos funcionários públicos.
- Pois é Luís, mas isso representava um arrombo no orçamento de quem a ela aderisse, e tu sabes tão bem como eu que uma semana sem receber é muito dinheiro.
- Claro que sim António, mas menos do que isso não assusta nem este, nem outro governo que seja.
- Ainda hoje o meu pai diz que quando, há uns anos, os funcionários das finanças decidiram fazer uma greve de 15 dias, o ministro da tutela veio logo com falinhas mansas perguntar-lhes afinal que exigências eram as deles.
- Naturalmente que só assim é que resultaria, mas hoje em dia, nem os sindicatos fazem exigências tão ousadas.
- Olha amigo Luís, vamos é terminar este magnífico cabrito assado que a Susana confeccionou, antes que arrefeça.
- Tens razão António, mas não sem antes pedir à Cristina que traga mais uma garrafa deste excelente tinto da "Herdade da Comporta".

MENINO MAROTO

I
«O Irão entrou na fase da escala industrial do combustível nuclear e o caminho para o progresso da nação iraniana é irreversível», lia o Paulo sentado ao balcão do bar da pensão.
- Pois, parece que sim, parece que o presidente do Irão está mesmo obcecado com o nuclear.
- Na verdade Mário, penso que nem sequer a ameaça de sanções, por parte da comunidade internacional, fazem recuar Mahmud Ahmadinejad.
- Mas Paulo, o homem insiste em dizer que é um programa pacífico e que apenas pretende criar alternativas energéticas para o país.
- Talvez ele até tenha razão naquilo que diz Mário mas, por exemplo, o estado de Israel não pensa dessa maneira e, segundo li há dias num semanário nacional, está mesmo disposto a atacar aqueles que considera os seus inimigos mais ameaçadores.
- Eu até li, que a força aérea israelita já está a fazer treinos intensos para se preparar para um (eventual) ataque ao Irão.
- Quer então dizer que poderá estar por um fio essa ofensiva.
- Tudo indica que sim Paulo e, se isso acontecer eu nem quero, ou melhor, não consigo imaginar as consequências que trará para o mundo esse confronto e penso muitas vezes se haverá potências que se irão juntar a um lado e a outro ou se, muito simplesmente, os beligerantes não ficarão sozinhos a lutar um contra o outro.
- Bem Mário, a ter que ser, que seja assim. Que eles se entendam uns com os outros e que limitem os danos àquela zona do globo, já de si tão fragilizada.
- Pois é Paulo, mas tu bem sabes que as repercussões desse (possível) confronto, se vão estender a todo o mundo e, como é bom de ver, quem vai sofrer vão ser sempre os mesmos.
- Claro, os pobres, as crianças, os idosos e todos os que, sem nada terem a ver com isso, vão levar por tabela.
- Como sempre meu caro amigo, como sempre.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

BARRICAS OLEOSAS

A Susana veio dizer-me à recepção que, caso aparecesse alguém para entregar umas barricas de plástico, a avisasse.
- Barricas como?
- Barricas grandes e cinzentas.
- Mas para que é que tu queres isso?
- Então não sabes que a nossa autarquia assinou ontem um protocolo com uma empresa que transforma óleos alimentares usados em biodiesel e agora essa empresa anda a distribuir os recipientes para, no nosso caso, colocarmos o óleo que utilizamos na pensão.
- Mas a D. Rosalinda sabe disso?
- Claro que sim Mário, até foi ela que pediu ao engº. Pedro Marceneiro que lhe fosse entregue, ainda hoje, uma ou duas daquelas barricas.
- Engº. Pedro Carpinteiro, rapariga!!!
- Ou isso, mas não interessa o nome do homem, o que interessa é que ele está muito entusiasmado com a ideia e vai oferecer barricas a todos os estabelecimentos de restauração existentes no nosso concelho.
- Bom Susana, se o entusiasmo manifestado na recolha de óleos alimentares for tão grande como o entusiasmo manifestado na recolha do papel, do vidro ou do papelão, então estamos desgraçados porque nunca, nas nossas viaturas, vamos colocar uma única gota desse biodiesel.
- Não sejas mau Mário, a nossa autarquia até se tem esforçado por pôr em prática uma política eficaz de recolha de desperdícios recicláveis.
- Não noto nada Susana. Então admite-se que, por exemplo, junto à Escola Beira Aguieira, um local onde todos os dias se produz desse lixo biodegradável, não exista sequer um ecoponto.
- Pois, realmente não se admite, mas também não podemos exigir que eles coloquem ecopontos em todo lado.
- Claro que não Susana, apenas que os coloquem nos locais onde são mais necessários.
- Pronto está bem Mário, parece que tens sempre razão. Não te esqueças é de me chamar, quando chegar o homem com as barricas.
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